Por Venício A. de Lima
03/11/09
Durante o longo processo de negociação envolvendo representantes do Congresso Nacional, dos empresários e da sociedade civil que resultou na redação e aprovação do projeto que se transformou na lei nº 8.977 de 6 de janeiro de 1995 (a Lei do Cabo), um dos pontos polêmicos foi a inclusão dos chamados "canais básicos de utilização gratuita" e, em particular, dos "canais comunitários", abertos para "utilização livre de entidades não governamentais e sem fins lucrativos" [letra g) do artigo 23].
Os setores empresariais venceram parcialmente as negociações e a Lei do Cabo se omitiu inteiramente sobre os recursos para financiar a produção de conteúdo para os canais comunitários.
De onde as organizações da sociedade civil "tirariam" os elevados investimentos necessários para colocar e manter no ar tais canais?
Mais de doze anos atrás, publiquei no jornal O Tempo, de Belo Horizonte (22/1/1997, pág. 8), pequeno artigo escrito com o jornalista Paulino Motter, à época diretor da Fenaj – "TV a cabo e canais comunitários" –, no qual discutíamos a situação dos canais que, dois anos após a assinatura da lei, ainda tentavam "entrar no ar" e, sobretudo, propúnhamos a criação de um fundo público específico, com recursos oriundos, por exemplo, dos leilões para concessões dos serviços de TV a cabo, que viabilizasse a implantação dos canais comunitários.
Tal fundo nunca foi criado e são notórias as imensas dificuldades que até hoje enfrentam os heróicos canais comunitários que funcionam no país – resistindo a se transformarem, direta e/ou indiretamente, em comerciais ou meros retransmissores de programação "cedida" por canais comerciais.
Rádios comunitárias
Três nos após a Lei do Cabo, o Congresso Nacional aprovou também a Lei das Rádios Comunitárias (lei nº 9612/98). Além de seu aspecto restritivo e limitador, a norma não estabelece nenhuma fonte específica de recursos para as fundações e associações comunitárias, sem fins lucrativos, que são as únicas entidades legalmente "competentes" para explorar os serviços de radiodifusão comunitária.
E, mais recentemente, quando a lei nº 11.652/2008 criou a EBC – Empresa Brasil de Comunicação, foi criada também a Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública, mas foram deixados de fora do financiamento desses recursos tanto os canais comunitários como as rádios comunitárias.
PL nº 6087/2009
Às vésperas da realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, a criação de fundos para a comunicação pública é uma reivindicação óbvia dos movimentos sociais e das entidades que há anos buscam a complementaridade entre os sistemas de radiodifusão – privado, público e estatal – como, aliás, manda a Constituição em seu artigo 223.
Coincidentemente aparece agora no Congresso Nacional um projeto de lei que também trata de resolver a questão. O PL nº 6.087/09, apresentado no final de setembro na Câmara pelo deputado Edson Duarte (PV-BA), cria a Contribuição para o Desenvolvimento da Radiodifusão Comunitária (CONDETVC), com o objetivo de financiar a radiodifusão comunitária prestada por qualquer meio ou tecnologia de comunicação, abrangendo tanto as rádios e televisões comunitárias como os projetos de
telecomunicações (ver, abaixo, íntegra do PL).
A CONDETVC seria proveniente da contribuição de empresas de rádio, televisão e de telecomunicações com 0,5%, 1,5% e 3%, respectivamente, de seu faturamento. Os recursos arrecadados seriam direcionados para o Fundo Nacional da Cultura, já existente e em funcionamento, e que tem entre suas finalidades o financiamento de atividades no setor de produção e de programação audiovisual.
Segundo a justificativa do PL, o faturamento anual das empresas de radiodifusão, estimado em R$ 11 bilhões, e das empresas de
distribuição de televisão por assinatura, estimado em R$ 6 bilhões, garantiria cerca de R$ 350 milhões anuais para a radiodifusão
comunitária.
Apoio da Confecom
A 1º Confecom não é deliberativa, mas propositiva. Espera-se, todavia, que as propostas por ela aprovadas sejam transformadas em projetos de lei pelo Executivo ou por deputados e /ou senadores.
Por outro lado, é necessário que se faça um levantamento dos projetos de lei já em tramitação no Congresso Nacional e que contemplam as reivindicações consensuais, por exemplo, da radiodifusão comunitária. O apoio da Confecom a esses projetos de lei talvez acelerasse a sua aprovação e, portanto, a solução de alguns dos problemas históricos das comunicações no país.
*** Projeto de lei nº 6.087/09, de 2009
Cria a Contribuição para o Desenvolvimento da Radiodifusão Comunitária – CONDETVC.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Esta lei cria a Contribuição para o Desenvolvimento da Radiodifusão Comunitária - CONDETVC - com o objetivo de financiar a radiodifusão comunitária prestada por qualquer meio ou tecnologia de comunicação.
Art. 2º A CONDETVC terá por fato gerador a prestação dos seguintes serviços:
I - radiodifusão privada sonora;
II - radiodifusão privada de sons e imagens;
II - telecomunicações que se utilizem de meios que possam, efetiva ou potencialmente, distribuir conteúdos audiovisuais.
Art. 3º A CONDETVC será devida a cada ano pelos detentores de outorga para prestação dos serviços de que trata esta Lei e corresponderá aosseguintes percentuais sobre a receita bruta:
II - 1,5% (um e meio por cento) do faturamento para as empresas de que trata o inciso II do art. 2º;
III - 3,0% (três por cento) do faturamento para as empresas de que trata o inciso III do art. 2º.
Art. 4º O produto da arrecadação da CONDETVC será destinado ao Fundo Nacional da Cultura de que trata a lei no 7.505, de 2 de julho de 1986 e alocado em categoria de programação específica, para aplicação exclusiva em atividades de fomento e de desenvolvimento de iniciativascomunitárias de produção e distribuição de conteúdos audiovisuais.
Parágrafo único. No mínimo, 30% (trinta por cento) da CONDETVC deveráser destinada a iniciativas de rádios e Televisões comunitárias estabelecidas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
Art. 5º Aplicam-se à CONDETVC as normas do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972.
Art. 6º Esta lei entra em vigor no ano seguinte após a sua publicação.
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Maninho, Abraço RJ e
www.abracorj.org.br