apoio cultural poderá ser realizado por entidades de direito privado e de direito público.

sábado, 2 de maio de 2009

Falta fazer valer a complementaridade para democratizar o acesso aos meios

30/04/2009 |
José Luiz do Nascimento Sóter*

O debate em torno da democratização da comunicação não é novo. Há anos, movimentos sociais, como o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), reivindicam uma pluralidade maior nos meios, defendendo, entre outras ações, a regionalização da produção midiática como forma de abrir espaços para a manifestação das culturas locais.
Uma vitória importante nessa luta foi a inclusão, na Constituição de 1988, do artigo 223, que determina a complementaridade dos sistemas privado, público e estatal:
"Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, publico e estatal".
A discussão, antes restrita aos gabinetes do Congresso Nacional, ganhou as ruas naquela época. O debate sobre os sistemas demonstrou a necessidade de uma radiodifusão pública. As formulações evoluíram para o conceito da radiodifusão comunitária e, em 1998, aprovou-se a Lei 9.612 que, mesmo precária, reconhece e regula as rádios comunitárias.

Os meios de comunicação hegemônicos, entretanto, elegeram a radiodifusão comunitária como inimiga. Campanhas nacionais ainda tentam jogar a opinião pública contra um direito adquirido por lei. Acredito que essa agitação se dá porque o movimento de rádios comunitárias vê na complementaridade a possibilidade de inclusão das mais remotas localidades no direito à comunicação.
Os pequenos municípios estão à margem do sistema privado. As grandes empresas de comunicação buscam a alta lucratividade, baseadas na relação custo-benefício. Por consequência, centralizam a produção, diminuem os recursos humanos, excluem os mercados locais de suas planilhas publicitárias e fecham as portas às manifestações artísticas e culturais populares.
Hoje enfrentamos a triste realidade de não termos mais espaços no dial. As frequências foram ocupadas pela radiodifusão privada. E, assim, questiono: onde está a complementaridade entre os sistemas? Tirando os destinados às emissoras ligadas ao Estado, não sobram canais pra outras formas de radiodifusão, dentre elas a comunitária.
O senador Arthur da Távola, relator do referido artigo durante a formulação da Carta Constitucional, considerava que o mais importante eram as medidas que significassem a democratização na outorga dos canais. Segundo ele, “havendo um equilíbrio na concessão, se alcançaria o pressuposto da democratização nos meios de informação”.
Portanto, na formulação da pauta da Conferência Nacional de Comunicação, que ocorre em dezembro, devemos aprofundar o debate sobre o principio da complementaridade dos meios, a partir da redistribuição dos canais de radiofrequência. Defendo que essa redistribuição seja democrática e equitativa, concedendo a cada sistema um terço do dial.
No sistema privado, estariam contempladas as emissoras comerciais; no público, as emissoras sem fins lucrativos e de gestão pública (comunitárias e educativas); e no estatal, as emissoras ligadas aos poderes Executivo, Judiciário e Legislativo (inclusive as rádios universitárias). Creio que, dessa maneira, a complementaridade estará garantida. Não dá para continuarmos burlando a Constituição Brasileira, destinando privilégios aos empresários e retirando as emissoras do campo público, como as comunitárias, para fora do dial.

*José Luiz do Nascimento Sóter
Coordenador-geral da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária
Participante da Coordenação Executiva do FNDC

Anistia às comunitárias terá de ser pautada na Confecom


30/04/2009 Ana Rita Marini
FNDC


A Conferência Nacional de Comunicação deverá ser palco, entre as tantas demandas do setor, para a continuidade do debate sobre a descriminalização das rádios comunitárias. Sofreram um revés os vários projetos que tramitam no Congresso, no sentido de que a operação de rádio de baixa potência não outorgada no Brasil deixe de ser considerada crime enquanto correm os processos para sua legalização.
Quando já circulava em instância final de apreciação, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, o Projeto de Lei nº 4.549/98 – que prevê anistia à radiodifusão comunitária praticada sem o documento de outorga – um Requerimento (nº 4.298/2009) foi apresentado pelo deputado Raul Jungmann (PPS) pedindo a apreciação do PL pela Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado (CSPCCO).
O PL 4.549/98 tem apensados outros seis projetos de lei afins: 4.808/98, 3.225/00, 796/03, 4.294/04 e 4.573/09, este último proposto pelo Governo Federal, em janeiro último. O Executivo assume, nessa proposta, o entendimento que o direito à liberdade de expressão e de informação são fundamentais em qualquer democracia.
Em sua justificativa, no Requerimento à CCJ, Jungmann declara que a matéria trata de assunto “diretamente ligado à segurança pública, na medida em que não raras vezes tem-se notícia do uso de rádios clandestinas pelo crime organizado”.
Na avaliação do coordenador Executivo da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), José Luiz do Nascimento Sóter, esse movimento do processo dentro da Câmara seria uma reação contrária dos empresários da radiodifusão à possibilidade de descriminalização da radiodifusão comunitária (radicom) e a anistia dos seus militantes. “O deputado Raul Jungmann deve estar defendendo esses interesses, para barrar o projeto, porque eles tratam rádio comunitária como crime. Como ele vai mandar um projeto de anistia para ser tratado na comissão sobre crime organizado?”, reclama Sóter.
Nenhuma ação específica deverá ser empenhada neste momento junto à CSPCCO, de parte da Abraço. O PL está parado na Comissão, aguardando a designação de relator. Para o dirigente, o movimento pela radicom, que se prepara para a realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), que acontecerá de 1º a 3 de dezembro em Brasília, deve se concentrar em sensibilizar os representantes do poder público e da sociedade civil em geral, no âmbito da conferência. “Como nós estamos envolvidos na organização da Confecom, e acreditamos que a tramitação do projeto na Câmara vai ser morosa [porque voltou ao ponto zero, então terá de voltar à Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática – CCTCI – e novamente à CCJ], qualquer esforço que a gente tente agora junto a essa comissão vai ser inócuo. Nossa ação será preparar o melhor possível nossa demanda para levar à Conferência”, conclui Sóter.

Comissão organizadora da Conferência de Comunicação tem mais peso do empresariado

Por Raquel Junia
30.04.2009

Finalmente, no dia 17 de abril, o governo federal expediu o decreto convocando a Conferência Nacional de Comunicação. Para os movimentos sociais e entidades que há bastante tempo lutam pela realização da Conferência, essa é uma vitória. Entretanto, a batalha está apenas começando.

A portaria que especifica a composição da comissão organizadora da Conferência apresenta um desequilíbrio entre o campo da sociedade civil não empresarial – movimentos, entidades, sindicatos – e os empresários da mídia. A composição de 10 membros do poder público e 16 da sociedade civil, divididos em oito do empresariado e oito dos que não são empresários, incluindo neste último grupo a associação de emissoras públicas, não agradou aos que vem lutando pela realização da Conferência.
Nas oito vagas destinadas à sociedade civil não empresarial estão as seguintes entidades: ABCCOM (Associação Brasileira de Canais Comunitários), Abraço (Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária), CUT (Central Única dos Trabalhadores), Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), Fitert (Federação Interestadual dos Trabalhadores de Empresas de Radiodifusão e Televisão), FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação), Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social, e Abepec (Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais).

“A Abepec é, na realidade, mais uma representação do poder público, enquanto que as demais cadeiras da sociedade civil (oito) são ocupadas por representantes de entidades empresariais”, afirmou em nota a Comissão Paranaense Pró-Conferência. De acordo com esse raciocínio, na verdade, sobram sete vagas para o campo não-empresarial.

A análise, entretanto, não pode ser feita apenas numericamente. O problema está no fato de que por mais que a proporção fosse exatamente a mesma entre empresariado e movimentos sociais, ainda seria, de acordo com os movimentos, uma grande injustiça. O empresariado é, na realidade, uma porcentagem muito pequena da sociedade brasileira. Para o Coletivo Intervozes, uma das entidades que fazem parte da Comissão Organizadora, há uma super representação do empresariado.

“Ainda que não fosse possível contemplar todos os setores da sociedade, nos parece pouco razoável que haja tamanho corte na representação dos movimentos sociais em favor de uma clara super representação dos setores empresariais, como é o caso da dupla representação das TVs comerciais e tripla representação da mídia impressa. Esses grupos possuem grande poder econômico e político, mas representam, proporcionalmente, um percentual ínfimo na sociedade brasileira”, afirmou o coletivo também em nota pública.

Nas oito vagas dos empresários, estão: Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT), Associação Brasileira de Radiodifusores (ABRA), Associação Brasileira de Provedores Internet (ABRANET), Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA), Associação dos Jornais e revistas do interior do Brasil (ADJORI BRASIL), Associação Nacional de Editores de Revistas (ANER), Associação Nacional de Jornais (ANJ) e Associação Brasileira de Telecomunicações (TELEBRASIL).


Governo desconsiderou proposta da Comissão Nacional Pró-Conferência
Da Comissão Nacional Pró-Conferência (CNPC), participam 33 entidades que somaram forças para garantir a convocação da Conferência. Além desta, existem comissões estaduais que estão em diálogo com a nacional na tentativa de garantir a mobilização nos estados.

Em fevereiro deste ano, a Comissão Nacional teve uma reunião com o Ministério das Comunicações, na qual apresentou uma proposta de composição da Comissão Organizadora. A proposta apresentada destina doze vagas para o segmento não empresarial da sociedade civil, dez para o poder público (considerados governo, parlamento e judiciário), cinco para entidades empresariais, duas para a mídia pública e uma para a academia.

“Na ocasião, foi solicitado que o governo agendasse novo encontro para apresentar sua avaliação sobre a proposta de modo a avançar no debate sobre o formato final do que viria a ser a Comissão Organizadora. Porém, após apresentação da proposta, a CNPC só conseguiu uma reunião com representantes do Executivo dois dias antes da publicação do decreto que convocou oficialmente a Conferência e cinco dias antes da publicação da Portaria 185, quando recebeu a notícia de que a composição da Comissão Organizadora já estava definida”, relata o Intervozes. O coletivo ressalta ainda que a composição estabelecida pela portaria está em desacordo com a proporção adequada em outras conferências, como a de saúde.

O que fazer?

Em carta para o ministro das Comunicações Helio Costa, no dia 27 de abril, a Associação Mundial de Rádios Comunitárias (AMARC) apresenta algumas sugestões para que a Conferência seja transparente e participativa. Entre as indicações está a de que a proposta de composição da Comissão Organizadora feita pela Comissão Nacional Pró-Conferência seja considerada. E também que a Conferência seja deliberativa.

A Comissão Paranaense Pró-Conferência defende a revisão da portaria e a indicação de suplentes pela Comissão Nacional.

“Reconhecemos e legitimamos as entidades já indicadas por sua história de luta e compromisso com as nossas bandeiras, mas avaliamos como um desrespeito ao processo democrático conduzido pela Comissão Nacional Pró-Conferência de Comunicação que esta indicação tenha sido feita pelo governo e sem levar em conta a subrepresentação social que tal composição significa”, aponta a Comissão paranaense.

Para Noeli Godoy, representante do Conselho Regional de Psicologia (CRP 05) no Comitê Rio Pró-Conferência Nacional de Comunicação rever a portaria é uma possibilidade difícil de ser aceita pelo governo federal. Ela avalia que essa composição não é a que os movimentos esperavam, mas também não é das piores. “Apesar de muitos parceiros terem ficado de fora, existe uma possibilidade de diálogo com essa comissão”, acredita. Noeli ressalta que, embora o Conselho Federal de Psicologia (CFP) tenha ficado de fora da comissão, o CFP faz parte do FNDC, então, de certa maneira, está representado. O CFP historicamente vem atuando no campo da democratização da mídia.

Mobilização

Para além da discussão em torno da composição da Comissão Organizadora, os comitês nacionais e estaduais também precisam agora jogar peso na mobilização para que muita gente participe direta ou indiretamente das etapas da Conferência. Ainda não foi definido pelo governo federal o regulamento para a realização das conferências em todas as etapas - municipal, estadual e federal. Mas os movimentos precisam correr contra o relógio porque com o atraso do decreto presidencial, o tempo para realizar as etapas está apertado.

Para Luis Gonzaga da Silva, o Gegê, da Central de Movimentos Populares do Brasil e do Movimento de Moradia do Centro de São Paulo, a realização da Conferência é um grande avanço, já que no Brasil há um grande cerceamento do direito de voz do povo pobre. “Talvez se democratize a comunicação, o debate vai estar presente e com certeza poderemos aprofundar. Vai ser muito pesado porque os meios de comunicação [comerciais] vão jogar pesado para não serem atrapalhados”, opina.

Ele também critica a composição da comissão organizadora, mas alerta: “Precisamos nesse momento pegar esse pássaro que já está na mão para depois correr atrás do outro que está voando”. Gegê diz ainda que os movimentos nos quais atuam tentarão participar das conferências de comunicação, mas ao mesmo tempo também terão que participar de conferências de outras áreas que serão realizadas nesse ano, o que pode dificultar um pouco a presença em maior número.

“O tema da comunicação é muito espinhoso, temos que insistir com os movimentos, não esperar que eles venham até nós, que comecem a participar das reuniões. Nós é que temos que ir até eles e contagiá-los, seduzí-los, aposta a psicóloga Noeli Godoy.

Núcleo Piratininga de Comunicação