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A lista divulgada inclui somente as sanções relacionadas a conteúdo ou questões jurídicas, sob responsabilidade do ministério. Já as sanções técnicas ou por operação não autorizada, de responsabilidade da Anatel, não entram na relação (veja aqui o quadro resumo das sanções, disponibilizado pelo MinCom). Oliveira aponta que as sanções de conteúdo provêm de um convênio ilegal estabelecido entre o ministério e a Anatel, que passa a ser autorizada a realizar fiscalização de conteúdo. "Isso não cabe a ela. A lei 9472, que criou Anatel, estabelece como função organizar a exploração dos serviços de Telecomunicações. Seu papel em relação à radiodifusão é fiscalizar questões técnicas, não conteúdo", explica.
A celebração do convênio aconteceu em 2007, com ampliação das atribuições da agência em 2011. Além de fiscalizar as questões técnicas, a Anatel passa também a verificar se as emissoras estão cumprindo suas obrigações em relação à programação. Assim, pode fiscalizar os percentuais de notícias, de propaganda e o horário obrigatório de veiculação da Voz do Brasil, e ainda abrir processos contra a empresa infratora, o que antes era feito pelo ministério. Em 2001, a deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP) se opôs publicamente, declarando que a Anatel não consegue cumprir sequer suas atribuições legais, como a fiscalização das fontes emissoras de radiação eletromagnética e dos limites de exposição humana a campos eletromagnéticos, que podem prejudicar a saúde de crianças e idosos.
Para Oliveira, é preciso questionar o convênio na Justiça, para interromper o processo em curso de criminalização das emissoras comunitárias. "Recentemente, a Anatel e o Ministério das Comunicações treinaram 500 agentes. Houve um aprimoramento da repressão", complementado pela portaria 462/2011, que define conceitualmente o que é propaganda, publicidade e apoio cultural. "Esse é um mecanismo legal de repressão ao conteúdo. Antes havia certa flexibilização, sem condições jurídicas de punição".
De acordo com a norma, são proibidos os anúncios de produtos, bens, serviços, promoções, preços, ofertas, condições de pagamento, ou quaisquer outras vantagens que promovam o anunciante. Além disso, os apoios culturais se restringem aos anunciantes abrangidos pelo raio de um quilômetro da antena da emissora, que está sujeita a multa em caso de descumprimento. "Já as TVs e rádios comerciais podem veicular qualquer coisa, vale tudo. Isso evidencia o caráter repressor", questiona Oliveira.
Heliópolis
A Rádio Comunitária Heliópolis FM (http://www.heliopolisfm.com.br/), em São Paulo, SP, é uma das vítimas desse processo de criminalização da comunicação popular. Reginaldo José, o coordenador da emissora, diz ter recebido recentemente uma notificação do Ministério relacionada aos apoios culturais. "Infelizmente, as rádios comunitárias enfrentam várias dificuldades para se manter, e a portaria nos prejudica ainda mais, porque a maioria dos programas consegue sobreviver através dos apoios". Régis, como é conhecido, explica que a norma "não dá condição para o comércio local divulgar na rádio. O pessoal aqui está começando a anunciar agora, e veio a notificação. Temos preocupação de como seguir em frente. O risco é a rádio não existir mais. Como podemos pagar as contas de água e luz"?
Os recursos obtidos com os apoios culturais são direcionados aos serviços de manutenção da rádio. "Os locutores são todos voluntários. O dinheiro é para manter a rádio, já que o poder público não nos ajuda em nada. Apenas cumprimos o papel que seria do poder público, transmitindo vinhetas de utilidade pública, por exemplo".
A preocupação também se relaciona com a importância da rádio para valorizar as ações culturais e o comércio local. "O pessoal quer anunciar, falar mais sobre suas atividades. Por que não pode? É comércio local. Isso ajuda a valorizar o lugar em que vivemos. A maioria dos moradores tem orgulho de falar que mora aqui e quer fazer algo para mudar, querem ajudar a comunidade de alguma forma". Por isso, a preocupação é grande na rádio, que pretende se unir às demais para enfrentar a repressão institucional.
Ribeirão Preto
Também com base nos apoios culturais, o MinCom notificou e multou a Rádio Educativa FM, de Ribeirão Preto, interior de São Paulo, SP, uma emissora comunitária legalizada há oito anos. "A primeira notificação que recebemos se valia de uma norma publicada um ano depois da suposta infração. Fizemos a defesa com base nisso e logo recebemos uma nova notificação, com base em outra legislação", conta Juliano da Costa Bezerra, coordenador da rádio.
Ele também defende a importância dos apoios culturais, pois permitem a manutenção da rádio e divulgação do comércio local. "Nossos locutores são todos populares, voluntários, trabalham por amor, não por dinheiro, porque não tem pagamento. O apoio é de extrema importância, sem ele não tem como manter a rádio, ficaria inviável".
Bezerra explica que a definição de apoio cultural torna o anúncio nada atrativo ao comércio, pois só permite a divulgação de endereço, nome e telefone. Ele destaca ainda que as rádios comunitárias têm práticas diferentes das comerciais, com uma programação mais popular, sem cobrança para transmissão de músicas ou divulgação de shows, teatro e cinema gratuitos.
Além disso, o locutor questiona a diferença de tratamento pelo MinCom e Anatel em relação às emissoras comerciais. "Na minha cidade, quando ligávamos o nosso transmissor, uma rádio comercial entrava no nosso canal. Isso nunca levou a uma visita da Anatel ou fiscalização. Já quando uma locutora novata nossa atrasou a chamada de prefixo da rádio, recebemos uma notificação, sob pena de multa".
Valores desproporcionais
Outra desproporção está no próprio valor das multas. De acordo com a lista de sanções publicada pelo MinCom, o valor médio da multa aplicada às televisões comerciais é de R$ 9 mil; já a da rádio comunitária está em R$ 1,6 mil. "Mas um contrato de apoio cultural com uma rádio comunitária é de R$ 50, já com uma emissora de TV é de R$ 2 milhões. A desproporção é enorme, o pagamento da multa pela comercial é simbólico. Com a rádio tem outro peso", explica Oliveira.
Para ele, o recurso que o governo investe para reprimir a radiodifusão comunitária poderia ser utilizado para formar milhares de comunicadores populares. "O governo nos deu um órgão de repressão. Queremos liberdade de publicidade e propaganda, para comércios situados no município. Não aceitamos propaganda da Coca Cola, por exemplo, mas a rádio precisa de sustentabilidade". Ele lembra que o setor privado fatura mais de R$ 1,8 bilhão com verbas institucionais de comunicação. "Parte disso deveria ser destinada às rádios comunitárias".
O coordenador da Abraço-SP acrescenta ainda que, em 2011, o governo federal perdoou R$ 8,4 milhões em dívidas de emissoras de rádio e TV comerciais, ao considerar prescritos os 8.231 processos abertos por irregularidades cometidas entre 1995 e 2007. Apenas 9% das multas foram quitadas. As punições se referem, principalmente, a transmissão de programação em raio maior do que o permitido, não respeitar o limite de 25% de propaganda comercial ou deixar de veicular a "Voz do Brasil".
Ministério das Comunicações
Em entrevista à Abong, o diretor do Departamento de Acompanhamento e Avaliação de Serviços de Comunicação Eletrônica do MinCom, Octavio Pieranti, defendeu que o convênio estabelecido com a Anatel é "absolutamente legal. O ministério delegou a competência, sem abrir mão de sancionar. A Anatel grava, oficia entidade, e a partir disso conclui o procedimento e envia para o Ministério, que sanciona".
Em relação aos apoios culturais, afirma que a definição em portaria ocorreu após consulta pública, e as rádios possuem cinco dias corridos para apresentação de defesa. "São publicidades comerciais, pois incluem menção a preço, produto e condições de pagamento. Não é juízo de valor".
Sobre o valor das multas, afirma que a variação se dá de acordo com o tipo de emissora. "Mas o Ministério tem que trabalhar com o teto definido em lei". Por isso, a diferença não obedece a proporcionalidade de valores arrecadados com a publicidade e propaganda. Ele também afirma que a fiscalização continuará. "Estamos fazendo por município, com procedimento similar ao das fiscalizações da Controladoria Geral da União (CGU). As rádios comunitárias dão voz à população e fazem prestação de serviços importante, mas a orientação é fiscalizar todas".
Por Hugo Fantom --
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